ENSIMESMADOS
Nesta sua primeira
individual em uma galeria de São Paulo, Flávio Cerqueira expõe o
desenvolvimento de sua obra ao passo que seus personagens tomam consciência de
um vasto horizonte, que se agiganta bem diante de seus olhos, incitando-os a extrapolar
a concha que outrora os prendia em um universo restrito e experimentar tudo
aquilo que antes lhes parecia impossível. Cerqueira nos convida a acompanhar
esta busca por algo mais – empreitada comum a todos nós – e se, ao longo do percurso,
nos esquecermos por um instante da pretensa segurança emprestada pelo
chão em que firmamos os pés, e nos permitindo voltar à
infância arriscarmos uma olhada para o
céu, erguendo nossa vista, teremos uma grata surpresa.
O
artista povoa o espaço expositivo com entes que adotam posturas reflexivas, cuja
grandiosidade não se traduz em monumentalidade, mas em obras que podem ser
apreendidas sem um distanciamento necessário, sugerindo
certa intimidade. A forma tradicional da escultura figurativa é o meio
escolhido pelo artista para tratar de temas recorrentes na contemporaneidade,
como a solidão, frustrações, expectativas e esperança. A rudeza do bronze é
dissimulada pela delicada pintura branca que Flavio confere às suas primeiras
obras, uma falsa fragilidade condizente com o estado de espírito que delas
emana. Na sequência, o artista deixa cair gradualmente este véu de porcelana
injetando força em suas figuras, livrando-as paulatinamente do exílio, trazendo
para o convívio elementos do mundo exterior, como uma escada ou galhos.
Inicialmente, suas
figuras se encontram em situações de total introspecção, conseguindo, contudo,
dialogar com o público, gerando de imediato uma sensação de reconhecimento, de
cumplicidade. E aquilo que se inicia como uma expressão autobiográfica,
mapeando um universo de sentimentos enraizados e conflitantes, adquire uma
dimensão coletiva.
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