Joseph Beuys. Como explicar imagens a uma lebre morta, 1965 |
Certo
dia uma colega de trabalho disse que um dia seria culta como eu! Como assim!?
Fiz chacota do comentário e nem perguntei o que ela julgava ser “culta como
eu”. Em seguida, porém, ela deu a entender que eu era culto por gostar de
arte... que triste.
Esta
semana fui a uma consulta e, quando a médica viu o livro que eu li enquanto
esperava, ela disse com um tom de voz que misturava espanto e deleite: “Arte
Contemporânea!? Que chique!”.
[mais uma vez] Como assim!?
Chique é curar doenças!!
Quando
eu digo, empolgado, que fui a uma exposição ou que vou a uma palestra sobre
arte, a maior parte dos meus colegas e parentes tem reações que vão do descaso
ao “que besta!” ou “que chique!”, passando pelo “que saco!”
Isso
me levou a refletir sobre qual o público que a arte encontra no Brasil (e que
provavelmente se repita em outros lugares), e a até que ponto estes comentários
são realmente absurdos e em que nível passam a fazer sentido.
Em
primeiro lugar: Eu não sou nem um pouco chique e tampouco um poço de cultura.
Eu simplesmente gosto de arte, estudo o assunto e sonho em me profissionalizar
na área. Se eu fosse administrador iria a simpósios sobre administração; Se
médico, sei lá, sobre cardiologia. E as pessoas achariam, talvez, interessante,
mas não chique ou indicativo de um alto nível cultural. Isso porque em nosso
país a idéia de cultura está apartada da vida social, que conta com aquilo que
é prático. Estudar engenharia tudo bem, mas arte!? Pra quê!? Com que
finalidade? Arte é luxo.
E
não há como condenar quem não participa da cena artística por acreditar nisso,
pois muitos daqueles nela inseridos fazem questão de sustentar esta ideia elitista,
fazendo com que possuir, conhecer e, até mesmo, apreciar arte seja visto como
um símbolo de status.
Por
outro lado, as instituições culturais realizam um constante esforço para atrair
um público cada vez mais heterogêneo para este mundo místico e distante que
parece ser o da arte, por exemplo, com exposições e palestras gratuitas. Mas
oferecer a possibilidade de contato não se faz suficiente, é necessário
estimular a procura por este contato. Se eu montar uma barraquinha em frente a
uma escola de ensino fundamental, oferecendo beterraba e repolho gratuitamente,
certamente, poucas crianças se interessarão por esta generosa oferta. Terei um
público dentre aqueles que os pais já incentivam a comer tais alimentos, e
aqueles que por sua natureza ou tem um apetite voraz ou são, no mínimo,
curiosos. A maioria preferirá um McDonalds qualquer, um biscoito recheado,
salgadinhos, refrigerante e tudo que é difundido como bom e bacana. Pra quê
legumes!?
Da
mesma forma, o que atrai nossa atenção são I-Phones, I-Pads, Ai se eu te pego,
e por aí vai. Nos interessa, diversão fácil para aliviar o estresse da rotina
que criamos para atingir um ideal de felicidade que inventamos.
Nos
ensinam desde a escola a consumir e competir. Não se formam cidadãos, formam-se
um grupo de indivíduos isolados, como numa composição de Giacometti, e que
apesar do olhar constantemente voltado para os próprios umbigos, não conseguem
sequer alcançar um autoconhecimento suficiente. Os outros nos interessam menos
ainda. Política é também outra esfera, igualmente apartada da vida como a arte.
Queremos seguir com nossas vidas, sem olhar para o lado e muito menos para
trás; seguir nosso ritual há muito instituído e sacralizado, preocupando-nos
apenas com aquilo que nos afeta de imediato. Já temos tanto no que pensar...
que nos importa questionar o estabelecido, compreender o outro e nos
descobrirmos. O que nos importa a história? É passado. O futuro é mais
interessante. O presente, vamos vivendo sem pensar muito nele.
A
arte representa o contrário de tudo isso, e por isso a proximidade com ela se
mostra difícil, não nos identificamos com ela. Parece um parêntese na nossa vida,
mas o é apenas na nossa rotina. Pois nada está tão intensamente banhado de vida
quanto a arte, e não falo de forma religiosa, como se ela fosse um deus. Pois os
deuses estão acima de nós. Ela está ao nosso lado, basta que viremos o rosto;
ou melhor, está diante de nós, basta que ergamos a cabeça.
é camarada... a arte é um esforço se fazer compreender, um esforço de amor. uma cultura que segrega a arte é uma cultura que tem pouco a oferecer, que se ressente de valores que não compartilha... que abate quem se "atreve" a valorizar outras coisas. Neste sentido, até quem aprecia arte começa a se sentir isolado, afinal naum temos com quem compartilhar nossas descobertas, sem contar a maneira como as pessoas se afastam quando conversamos sobre arte. meu medo é acabar virando um pondé da vida. abraço!!!!
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